Martha´s Vineyard

Autor:  Almir Cristiano | Publicado: 26/08/18 | Atualizado: 19/03/20 | Acessos: 14230

Onde fica

Martha's Vineyard (Vinhedo de Marta) é uma ilha na costa nordeste dos EUA, no estado de Massachusetts. Com uma área de 231,75 km2, Martha's Vineyard é a 57ª ilha dos Estados Unidos por área. A ilha hoje é predominantemente uma colônia de férias para veraneio.

Marthas Vineyard vista aérea
Vista aérea da ilha de Martha's Vineyard. Créditos: Sandpiper Rentals Inc

História

Era uma ilha isolada, e seus primeiros colonos vieram do sul da Inglaterra. Dentre eles, um surdo chamado Jonathan Lambert (1694), carpinteiro e agricultor. Jonathan casou-se com uma ouvinte, e geração após geração, seus filhos nasceram com o mesmo gene para a surdez. Por volta de 1710, a migração tinha praticamente cessado, e a comunidade endogâmica criada continha uma alta incidência de surdez hereditária, que persistiria por mais de 200 anos.

População surda

Em 1854, quando a população surda da ilha estava no pico, no continente a média nacional era de uma pessoa surda em cada grupo de 5728 ouvintes. Em Martha´s Vineyard a média era de uma pessoa surda em cada grupo de 155 ouvintes. Na cidade de Chilmark, que tinha a maior concentração de pessoas surdas na ilha, a média foi de um surdo para cada grupo de 25 ouvintes. Em um bairro de Chilmark chamado Squibnocket, havia um surdo para cada grupo de 4 ouvintes, ou seja, 25% da população local era surda.

A língua de sinais

Havia tantas pessoas surdas em Vineyard que os moradores desenvolveram uma língua de sinais para viabilizar a comunicação. Por volta do século 18, havia uma língua de sinais distinta na cidade Chilmark, que foi posteriormente influenciada pela língua de sinais francesa, formando a MVSL (Martha´s Vineyard Sign Language). No final do século 18 e início do século 20, praticamente todos habitantes da ilha possuíam algum grau de fluência na língua de sinais local.

Surdos sinalizando em MVSL
Surdos da ilha de Martha's Vineyard demonstrando a MVSL (Martha´s Vineyard Sign Language). Créditos: New England Historical Society

A vida na ilha

O continente não era um lugar tão bom para os surdos viverem. Muitas pessoas acreditavam que a surdez era um castigo. Enquanto as famílias com surdos desenvolviam seus próprios sinais em casa, a sociedade não conseguia entender estes sinais rudimentares, pois eram diferentes de casa em casa. Os estudiosos queriam que os surdos aprendessem como uma pessoa ouvinte. Quase não havia oportunidades de carreira para os surdos adultos. O melhor que se podia esperar era ser treinado para fazer algum trabalho manual ou outra tarefa muito simples.

As perspectivas para as pessoas surdas em Martha´s Vineyard eram completamente diferentes. A igualdade rara entre surdos e ouvintes foi uma coisa notável e maravilhosa. Os preconceitos sobre as pessoas surdas não existia, fazendo a comunidade da pequena ilha parecer o lugar perfeito para os surdos, um exemplo de como pode ser uma "utopia surda".

Algumas curiosidades:

  • Havia surdos em todas as famílias;
  • A maioria da população era bilíngue;
  • As pessoas eram vistas sinalizando mesmo quando não havia surdos presentes;
  • Os surdos eram agricultores, funcionários de lojas, ocupavam diversos postos de trabalho e também eram eleitos para cargos políticos, tornando-se prefeitos e vereadores, uma coisa inédita no resto do país;
  • Os agricultores sinalizavam para seus filhos em campos abertos, onde a voz não alcançava;
  • As crianças sinalizavam umas para as outras enquanto a professora estava de costas;
  • Os adultos sinalizavam durante os sermões da igreja, para não fazer barulho.
Ruas de Marthas Vineyard
Foto antiga de Martha´s Vineyard (sem data). Créditos: Museu de Martha´s Vineyard

Declínio da população surda

Na primeira metade do século XX, centenas de habitantes da ilha se mudaram para o continente, incluindo muitos surdos. Grande parte destas mudanças ocorreram por motivos de trabalho ou estudos, o continente nesta época estava se desenvolvendo muito rápido. As melhorias na infraestrutura tornaram mais fácil viajar de cidade em cidade, e a indústria do turismo, que se estabeleceu no final de 1800, quebrou as barreiras entre a ilha e o continente.

Foi uma mudança que permitiu novos genes, mas também novas idéias - e no continente, o conceito de educação para surdos estava começando a se firmar. Em 1817, a Escola Americana para Surdos (American School for the Deaf) - a primeira desse tipo nos EUA - abriu em Hartford, Connecticut, preparando as bases para o desenvolvimento de uma linguagem de sinais nacional. A escola, nos primeiros anos, era uma babel de gestos: alguns estudantes vieram de comunidades como Martha's Vineyard, que haviam desenvolvido sua própria língua; outros criaram sinais para a comunicação nas famílias; o primeiro professor da escola, Laurent Clerc, usou a língua de sinais francesa padronizada. Eventualmente, essas três linhagens se fundiram no que se tornaria a Língua de Sinais Americana (ASL), substituindo as línguas regionais.

A extinção da língua gestual MVSL

A última pessoa conhecida com surdez hereditária, Katie West, morreu em 1952. O número de ouvintes que ainda conhecem um pouco sobre o idioma MVSL está diminuindo rapidamente. Não há fotografias, vídeos ou diagramas que o preservem. Quase tudo o que se sabe sobre o idioma veio de histórias orais de pessoas que viveram durante o auge da população surda da ilha.

Na década de 1970, Nora Groce, então estudante de pós-graduação na Brown University, passou três anos viajando de Martha's Vineyard para entrevistar os residentes mais antigos da ilha em seu livro, "Everyone Here Spoke Sign Language". Mesmo assim, grande parte da língua gestual já estava perdida: "Tivemos vestígios dela, alguns gestos", disse ela, mas "não poderia ter reconstruído". A MVSL é um idioma extinto.

Martha's Vineyard atualmente

Martha's Vineyard nos dias de hoje é um lugar completamente diferente daquele em que surdos e ouvintes conversavam entre si em sinais. Apesar de ter desaparecido, a mais célebre das comunidades surdas é lembrete de uma maravilhosa igualdade entre surdos e ouvintes.

Marthas Vineyard em 2018
Martha´s Vineyard em 2018. Créditos: Pointbrealty.com


Referências:

MORKEL. Searching for the Deaf history of Martha’s Vineyard. Disponível em: <https://morkel.tumblr.com/post/116201541693/searching-for-the-deaf-history-of-marthas>. Acesso em: 15 Dez. 2019

POINT BREALTY. Martha’s Vineyard Open House Tour Features 7 Homes In Edgartown On Saturday. Disponível em: <https://www.pointbrealty.com/blog/marthas-vineyard-open-house-tour-edgartown-saturday-7-houses/>. Acesso em: 15 Dez. 2019

MARTHA'S VINEYARD MUSEUM. Photographs. Disponível em: <https://mvmuseum.org/collections/photographs/>. Acesso em: 15 Dez. 2019

SANDPIPER RENTALS INC. What´s your price point for rentals on Martha´s Vineyard?. Disponível em: <https://www.sandpiperrental.com/blog/wednesday-wonderings-ww-price-point/>. Acesso em: 15 Dez. 2019

NEW ENGLAND HISTORICAL SOCIETY. The Deaf Vineyarders Who Talked With Their Hands. Disponível em: <http://www.newenglandhistoricalsociety.com/deaf-vineyarders-talked-hands/>. Acesso em: 15 Dez. 2019

CARI ROMM. The Life and Death of Martha's Vineyard Sign Language. Disponível em: <https://www.theatlantic.com/health/archive/2015/09/marthas-vineyard-sign-language-asl/407191/>. Acesso em: 15 Dez. 2019.

JAMIE BERKE. Deaf History on Martha’s Vineyard. Disponível em: <https://www.verywellhealth.com/deaf-history-marthas-vineyard-1046546>. Acesso em: 16 Nov. 2019.

WILLIAM CAMERON. The Historical Significance of Martha’s Vineyard Sign Language. Disponível em: <http://www.lifeprint.com/asl101/pages-layout/marthasvineyard.htm>. Acesso em: 16 Nov. 2019.


Autor: Almir Cristiano | Publicado: 26/08/18 | Atualizado: 19/03/20 | Acessos: 14230


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